terça-feira, 24 de março de 2020

Quando o mundo parou

Há algum tempo o mundo vem passando por um cenário que parece saído de ficção científica. Assim como as imagens das torres gêmeas despencando pareciam cenas de filmes hollywoodianos, assistir, não apenas na televisão, mas no dia-a-dia, à cidades desertas é algo muito estranho. 

Anteontem me aventurei até a agência do banco, pois precisava ir ao caixa eletrônico. Ver a W3 completamente vazia, sem uma única vivalma, me remeteu à lembrança daquela Brasília de 30 anos atrás quando todos iam embora da cidade assim que as férias escolares começavam e, consequentemente, a cidade parecia fantasma.

Às idas à farmácia e ao supermercado também parecem surreais. Ao mesmo tempo que todos se solidarizam uns com os outros pela situação em que nos encontramos, esses mesmos olhares solidários tem por trás o medo. Pessoas se cumprimentam na rua, continuam simpáticas umas com as outras, mas os olhos parecem enxergar cada um como um hospedeiro em potencial desse inimigo invisível. 

Esse mesmo cenário desolador cria situações tragicômicas. Outro dia, na padaria, todos respeitavam a distância de 2 metros entre cada cliente até que um senhor entrou e deu uma única tossida. Imediatamente todos, absolutamente todos, deram um pulo pra trás ao mesmo tempo. Se um coreógrafo tivesse tentado conseguir tal sincronicidade num ensaio, não teria conseguido.

É estranho ver os militares em roupas amarelas especiais como aquelas do filme Epidemia desinfetando a rodoviária de Brasília. É estranho olhar pela janela e ver a quadra completamente vazia.

Aqui em casa a população humana se resume a minha mãe, eu, meus pequeninos, e Maria, nossa ajudante querida. Temos sorte de ter companhia. Penso naqueles que estão sozinhos em casa. Penso em como seria se estivesse em Montreal sozinha com meus nenéns. Teria que ir ao supermercado e farmácia com eles e, assim, expô-los ainda mais. Nesse momento, penso que foi bom decidir passar algum tempo da licença maternidade em Brasília com meus pais. Por outro lado, agora que estou perto dos amigos, só é possível encontrá-los virtualmente como se ainda estivesse no Canadá. Sim, é excelente termos a tecnologia que temos para nos comunicarmos com todos que amamos e que estão longe de nós, mas contato virtual não é e nunca será a mesma coisa do contato pessoal. Aliás, essa é a pior parte de tudo isso: não poder encontrar, abraçar e rir com os amigos.

Quando tudo isso passar, espero apenas que todos nós percebamos quanto tempo temos passado olhando para telas de celular e não para o rosto de um amigo. Quanto tempo passamos olhando redes sociais em aparelhos que tomam nossa atenção mesmo quando estamos na presença de outros. Espero, de coração, que reaprendamos a valorizar o contato pessoal, deixemos as telas de lado e aproveitemos a presença física uns dos outros.